quarta-feira, janeiro 17, 2007



Álcool e condução - Um problema grave de saúde em Portugal

Os acidentes de viação constituem, na União Europeia (UE), um grave problema de saúde pública, tendo sido responsáveis em 1998 por cerca de 43 000 mortos e 150 000 deficientes. Nos países industrializados são já a oitava causa de morte e, em Portugal, a sétima (1999). Portugal é o país da UE com a taxa mais elevada de mortalidade rodoviária. Numa perspectiva mundial, o número de mortos por acidente de viação é mais elevado do que o tumor maligno mais frequente (cancro do pulmão). É hoje consensual e nesse sentido o consagra também a Organização Mundial de Saúde (OMS), ser o alcoolismo um dos principais e dos mais graves problemas de saúde que a Europa enfrenta. Estima-se que um quarto das mortes dos europeus do sexo masculino do grupo etário dos 15-29 anos são atribuíveis aos efeitos adversos da ingestão excessiva de álcool. Nalguns países da Europa de Leste, aquele número chega a atingir um terço. Pelo contrário, a percentagem mundial de jovens dos 15-29 anos que morrem por causa do álcool é de 5%. Na região Europeia da OMS, em 1999, 55 000 jovens faleceram por causas relacionadas com o álcool.2 Nesta região, os produtos alcoólicos são responsáveis por 9% dos problemas de saúde e 40-60% dos óbitos por causa externa (em que se ignora se foram acidentais ou intencionalmente infligidas) estão relacionadas com o consumo excessivo de álcool.
Em Portugal, os acidentes de viação são a principal causa de morte em crianças, adolescentes e adultos jovens com idades compreendidas entre 1-25 anos. A mortalidade dos jovens do sexo masculino é três vezes mais elevada do que a do sexo feminino, em grande parte devido a acidentes. A taxa de mortalidade infantil (até aos 14 anos) é a mais elevada da UE sendo o dobro da Grécia, que tem a segunda taxa mais elevada e o quádruplo da Suécia, respectivamente 8,03, 4,64 e 2,32/105. Em 1999, 78% (2804/3595) dos mortos dos 15-34 anos foram indivíduos do sexo masculino. Esta ocorrência é apontada como um dos aspectos mais negativos no que concerne a situação de saúde, em Portugal, de acordo com um relatório da OMS.3 A condução sob o efeito do álcool é uma verdadeira epidemia. De uma forma geral, na UE, a média de indivíduos que conduzem com Taxa de Álcool no Sangue (TAS) acima dos limites legais ronda os 3%, enquanto esta percentagem se eleva para 25% quando se considera os condutores envolvidos em acidentes de viação fatais. Três por cento de condutores em Portugal, por dia, equivalem aproximadamente a 90 000 condutores com excesso de álcool no sangue.Em Portugal, a dimensão do problema é ainda maior dado que, actuando de modo sinérgico, se juntam duas características muito próprias dos portugueses:
1. Deterem a taxa mais elevada de mortes por acidentes de viação da União Europeia e uma das mais elevadas dos países industrializados, com a média anual nos últimos 5 anos de aproximadamente 2000 mortos;
Portugal tem também uma das taxas mais elevadas do Mundo, considerando o número de mortos por milhões de quilómetros percorridos (dos países que apresentam estatísticas): está nos 15 primeiros atrás de países como o Egipto, Sri Lanka, Iémen, Albânia, Equador, México.
2. Deterem um dos mais elevados consumos mundiais de álcool, per capita. O maior, segundo um trabalho efectuado, em 1997, pela Association Nationale de Prévention de L’Alcoolisme (França),5 o quarto em 2000 de acordo com a publicação World Drink Trends de 2002, imediatamente a seguir ao Luxemburgo, Irlanda e Roménia, com um consumo anual per capita de 10,8 litros. Estima-se que em Portugal existam cerca de um milhão de bebedores excessivos e, pelo menos, quinhentos a setecentos mil doentes alcoólicos. Cada português, em 2000, ingeriu em média 120 litros de bebidas alcoólicas (64,3 litros de cerveja, 51,7 litros de vinho, 4 litros de bebidas destiladas). Num texto introdutório de uma Resolução do Conselho de Ministros sobre o “Plano de Acção contra o Alcoolismo” é assumido de forma textual que “O alcoolismo é a maior toxicodependência dos Portugueses”.Toda a problemática envolvendo o alcoolismo é também uma das principais preocupações da Direcção-Geral da Saúde, que considera que “as situações de saúde associadas ao alcoolismo, (...) têm também um peso considerável na saúde dos portugueses”. Oconsumo de vinho está de tal modo arreigado na população portuguesa que, em 1980, se consumia mais vinho (96,5 litros) do que leite (71,8 litros), per capita, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística. Além do mais, a mortalidade por cirrose hepática é a segunda mais elevada da UE. No entanto, verifica-se a tendência decrescente do consumo de vinho, o que não é um fenómeno novo já que se tem vindo a reduzir paulatinamente desde há 40 anos, sendo em 1961 de 100 litros per capita. Esta tendência é verificada também nos países produtores da orla mediterrânica como é o caso da Espanha, França e Itália. A importância cultural e social do consumo de álcool não pode ser ignorada. Contudo, a OMS, baseada em diversos estudos científicos, no que diz respeito à eventual protecção cardiovascular conferida pela ingestão de álcool, não aceita que o seu consumo seja promovido, concluindo (já em 1984) que “Increased alcohol intake is not recommended as a preventive measure in coronary heart disease, either in populations or individuals – WHO Expert Committee on the Prevention of Coronary Heart Disease” (Não se recomenda o aumento do consumo de álcool como uma medida preventiva para a doença coronária cardíaca, quer nas populações ou nos indivíduos). O risco de morrer numa estrada em Portugal é 4 vezes superior à dos países com taxas de mortalidade mais baixas. Por exemplo, a região do Alentejo tem a taxa de mortalidade mais elevada de duas centenas de regiões dos quinze Estados-Membros da UE, com 406 mortos por milhão de habitantes (Eurostat, 1998). De forma semelhante, o risco de um condutor do sexo masculino de 15-24 anos morrer na estrada na região do Algarve (1050/106) é 40 vezes superior ao mesmo risco global para a generalidade do cidadão alemão em Berlim/Hamburgo (25/106). O automóvel e os motociclos são também a principal causa de morte dos jovens europeus com 15-24 anos: 4 em cada 10 jovens desta idade que perdem a vida na UE morre por acidente de viação. Na UE, para os indivíduos do sexo masculino dos 15-44 anos, o consumo excessivo de álcool e os acidentes de viação são as duas principais causas de “anos de vida ajustados pelas incapacidades” (Disability Adjusted Life Years - DALYs). Calcula-se que um em cada 80 europeus irá morrer de acidente de viação.Portugal tem a taxa de mortalidade global mais elevada da UE nos jovens do sexo masculino dos 15-24 anos (159/105), em parte devido aos acidentes rodoviários, (Holanda 61/105, Suécia 56/105). Portugal e a Grécia foram os únicos países em que, neste grupo etário, se assistiu ao aumento do número de mortos ao longo dos últimos dez anos, ao invés da tendência decrescente dos restantes países. Em Portugal, na última década, morreram na estrada aproximadamente 23 500 indivíduos (20 219 adicionados a 14% dos feridos graves que vêm a falecer, segundo o factor de correcção sugerido pelo Eurostat) e ficaram feridos cerca de 660 000. Com sida, no mesmo período, morreram 3919... A morte por acidente na estrada tem um enorme impacto na juventude portuguesa, já que afecta indivíduos muito jovens, visto que 40-45% têm menos de 35 anos. No grupo etário dos 15-34 anos, nos últimos 10 anos (1990-1999), faleceram 10 614 jovens. Dos 15 aos 24 anos, os acidentes de viação são responsáveis pelo menos por um terço do total de mortos (343 em 1999, seguida pelos tumores malignos em segundo com 79 casos e a sida com 75), sendo a principal causa de mortalidade nesta idade.

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